O que é Kung Fu

Na verdade a palavra kung fu é um erro de tradução da expressão chinesa “Gong Fu” (que se lê “kung fu”). Essa expressão se refere à habilidade verdadeira em uma arte em geral. Mas afinal o que é “Gong”? Fisicamente é a constante melhora no equilíbrio, coordenação, agilidade, flexibilidade, sensibilidade e força ou poder. Mentalmente e espiritualmente falando, são a consciência e a confiança trabalhadas (melhoradas), que promovem constantes avanços em direção à tranquilidade da mente e do coração.

Para desenvolver o Gong é preciso nutrir, reabastecer, equilibrar nossa energia, chamada de Qi (também escrito como “chi”). O Qi é a energia vital de um indivíduo. Para equilibrarmos a nossa energia basta apenas não desperdiça-la. Neste caso, a palavra desperdício se refere à qualquer atividade que não é essencialmente produtiva.

Desenvolvimento do Gong vai além do físico, pressupondo o trabalho de calma (jing), energia (qi), e espírito (shen). Desenvolvimento espiritual nas artes marciais é aplicado por meio do jing, qi e shen – a prática do cultivo interno.  Quando o marcial é combinado com o espiritual e se tem a experiência no corpo e na mente, isto então é a prática da arte marcial. Portanto, a prática das artes marciais é um exercício de aperfeiçoamento do jing, qi, e shen.

Bodhidharma

Bodhidharma por Tsukioka Yoshitoshi (1887)

A lenda de Bodhidarma e os monges do Templo Shaolin

Não se sabe ao certo quando surgiram as artes marciais chinesas. Isso porque existem poucas provas documentadas que sustentem uma história compreensível e factual. Até hoje o que se têm são diversos relatos passados de pai para filho durante gerações, compondo uma série de histórias e lendas.

Muitos creditam a Bodhidharma o título de fundador do kung fu. Segundo historiadores budistas, Bodhidharma (também conhecido como Ta Mo, Dharuma e Daruma Taishi) foi o terceiro filho do Rei Sugandha do sul da Índia e era membro dos kshatriya, ou casta guerreira. Ele recebeu seu treinamento em meditação budista do mestre Prajnatara, que foi responsável pela mudança do nome do jovem discípulo de Bodhitara para Bodhidharma.

Bodhidharma foi um excelente discípulo e logo se sobressaiu entre os colegas. Na meia-idade já era considerado um mestre budista. Quando Prajnatara faleceu, Bodhidharma decidiu partir para a China.

Diz a lenda que quando o imperador Wu viu Bodhidharma, ele o questionou da seguinte forma: “Eu trouxe as escrituras de seu país para o meu. Construí templos de grande beleza e fiz com que todos abaixo de mim aprendessem as grandes doutrinas budistas. Que recompensas eu receberei por isso na próxima vida?” Bodhidharma  replicou dizendo que o imperador não receberia nada, em referência à crença budista de que se você fizer alguma coisa esperando recompensa, tudo o que pode esperar é “nada”. O rei ficou tão furioso que baniu Bodhidharma do palácio. Bodhidharma então se dirigiu para o norte e depois de muito caminhar estabeleceu-se no monastério Shaolin (também chamado Sil-lum) no monte Shao-shih nas mostanhas Sung.

hung garDepois de chegar ao templo Shaolin, Bodhidharma meditou em frente a uma parede por nove anos. De sua meditação, resultou o budismo ch’an. Depois disso, Bodhidharma passou a reparar na rotina dos monges e notou que eles, em sua maioria, não possuíam resistência. Por isso, fundou uma série de exercícios que ajudavam a unir a mente e o corpo – exercícios que os monges guerreiros achavam benéficos a seu treinamento. Entre eles estavam o emprego da luta na forma do punho de pedra e das 18 mãos de lohan.

Relatos dizem que um monge chamado Chueh Yuan (também conhecido como Hung Yun Szu) aperfeiçoou o sistema para reunir 72 formas ou técnicas. Mais tarde, os 72 movimentos foram estudados por Pai Yu-feng e Li Cheng da província Shansi. Além dos métodos de Chueh Yuan, também foram estudadas as 18 mãos de lohan e, fundidos os métodos, foram criadas as 170 técnicas. Estes 170 métodos formaram a base do atual estilo Shaolin de kung fu, um estilo que é muito complexo em seus métodos e diversificação.

Os 170 métodos de Pai Yu-feng continham a essência de cinco animais: a serpente (she), o leopardo (pao), a garça azul (hao), o dragão (lung) e o tigre (hu). O tigre ensinou o método de força dos ossos; o dragão desenvolveu grande força do espírito; a garça azul ensinou o treinamento dos tendões; o estilo do leopardo representou extrema força e a serpente contribuiu com a capacidade de fluir o qi.

O sistema Shaolin desmembrou-se em cinco estilos distintos. Isto porque havia cinco templos Shaolin em vários distritos. O sistema original veio da província de Honan. Os outros sistemas foram chamados de acordo com as províncias em que se situavam os templos: O-mei, Wu-tang, Fukien e Kwang-tung. No sul (Cantão), as cinco variedades de Kung Fu Shaolin desenvolveram-se em sistemas familiares: Hung, Lau, Choy, Li e Mo.

Cada uma dessas cinco famílias desenvolveu suas próprias artes:

Hung Gar: Da família Hung. Fundado por Hung Hei Gung. Usa a força externa e exercícios de tensão dinâmica, apresentando posturas fortes.

Lau Gar: Da família Lau. Fundado por Lau Soam Ngan, é um sistema baseado em métodos manuais de médio alcance.

Choy Gar: Da família Choy. Fundado por Choy Gau Yee, cuja marca registrada é seus métodos de ataque a longo alcance.  Vale ressaltar que esse método não faz parte do sistema Choy Li Fut, embora tenha algumas semelhanças.

Li Gar: Da família Li. Fundado por Li Yao San, este sistema usa ataques de médio alcance com socos de médio alcance.

Mok Gar: Da família Mok (ou Mo). Fundado por Mok Ching Giu, este sistema tem socos de curto alcance e métodos de chute eficientes.

Artes MarciaisCom o princípio dos 170 métodos de Pai, o Kung Fu começou um novo período de crescimento. Contudo, nota-se que o Kung Fu não começou no templo Shaolin, na verdade floresceu através da influência de Shaolin. Por volta dessa época, o Kung Fu passou a ser categorizado como estilo (métodos) do Norte e do Sul.

Os sistemas do Norte destacam-se por suas técnicas de perna e seus padrões muito elegantes e extremamente trabalhados. Os métodos são ligeiros e graciosos. As técnicas do Norte adotaram essa especialização (de acordo com a lenda) por causa do terreno montanhoso que desenvolvia pernas fortes. Outros acreditam que o tempo inclemente forçava as pessoas a usar roupas pesadas. Isto exigia pernas fortes, já que a parte superior do corpo dificilmente se movia com rapidez.

Os estilos do Sul, por sua vez, usam posturas baixas, técnicas de mão potentes e chutes baixos rápidos. O povo cantonês, que pronuncia Kung Fu como Gung Fu, é mais baixo e mais atarracado e prefere usar métodos de mão. A lenda diz que como o Sul da China tem mais pântanos e água, o povo sulista remava mais, o que desenvolvia seus braços para técnicas de mão. Os praticantes do Gung Fu baseiam-se na velocidade, força, agilidade e resistência para executar seus ataques e defesas.

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